VOANDO POR AÍ

Laura, 45 anos, diretora de uma grande Empresa, voa com frequência em função da exigência da profissão. E nunca gostou de conversas bobas tipo como seria o voo, sobre o tempo, sobre quão chatas eram as esperas. Enfim… Conversas ocas. Então desenvolveu uma metodologia de espera para não ser incomodada. Fazia para se distrair, não tinha outras intenções. Sempre de olhos baixos lendo alguma coisa no seu iPad. Às vezes, poucas vezes,  apenas fingia ler. Pois bem, graças a este costume começava a conhecer as pessoas pelos sapatos, quando ficava entediada de olhar para a tela onde lia ou fingia ler. É, pelo sapatos. Ia levantando os olhos a partir dos pés das pessoas. Desenvolveu esta arte (Bem difícil.  Experimente!) de ir tipo escaneando, lentamente, sem saltar as partes ou ir de supetão dando de cara com a pessoa. E gostava de fazer elucubrações, a partir deste ponto de vista, (dos pés) e tirando conclusões ao percorrer cada pedaço (da pessoa).  Ria sozinha das suas conclusões. E foi sem poder conter o riso que conheceu Tiron.  Sapatênis, tamanho 42/44, homem alto, concluiu. Limpos. Caprichoso. Calça jeans quase padrão, logo não era um jovem. Garoto. Guri. Fedelho. Classificava assim todos com menos 40 anos. Coxas firmes. Uia… Óóóóó´, lamentou. Estava com uma revista no colo! Camiseta polo de cor única. Ela odiava as com listras. Mangas longas, que pena… não poderia apreciar os pelos dos braços. Mãos grandes, uma sobre a revista, outra segurando uma pequena valise de mão que estava apoiada na cadeira ao lado. Valise de couro marrom. Usada. Não velha. Voltando para as mãos. Nada de anel ou aliança. Homens usando anéis lhe causavam asco. Aliança indicava “fique longe”, se bem que os “com” eram tão ou mais disponível, não que ela buscasse qualquer deles. Laura já tinha tido vários relacionamentos. Tipo rápido, médio  e de 6 anos, que foi seu mais longo. Todos com términos  bem definidos. Com choro, sem choro, com raiva, decepção, enfim… Sofrência atual? Zerada. Mas vamos a descoberta de Tiron. Onde estava? Nas coxas…não.! Já passei das coxas. Mas estava nas mãos que dizem muito de um homem. Podia vê-las bem uma vez que os assentos da sala de embarque, daquele aeroporto, eram bem próximos.  Metro e meio de distância entre o frente a frente dos sentados. Unhas limpas e bem cortadas. A  avaliação ia tornando o homem do tipo de “bom padrão” para Laura. Ombros largos. Já havia passado pelo abdômen e gostado. Tinha uma protuberância que considerava  razoável. Homem muito sarado nessa idade lhe parecia um bobão querendo ter 18 anos. Bem, isso é coisa de cabeça de Laura. Chegou ao colarinho que tinha os dois botões abertos mostrando um pescoço sensual, sem correntinhas, o que lhe deu grande alívio. Homens de correntinha lhe pareciam afeminados, com cordões de grossos elos lhe causavam uma imediata paralisação no escaneamento e procurava outros pés.  Não era o caso. Uns pelos discretos se mostravam tímidos no pouco que via do peito.  Chegou na linha da boca e encontrou duas carreiras de lindos dentes. Sorriu para aquela boca, passou pelo nariz rapidamente e encontrou os olhos que sorriam junto com a boca e faziam ruguinhas, nos cantos, de enlouquecer qualquer uma. Os olhos dele se estreitaram e fizeram aquela expressão de quem estava sabendo o que Laura esteve fazendo, e provavelmente pensando, ao percorrer sua pessoa naqueles minutos. Ele havia acompanhado cada expressão dela e fez enorme esforço para não mover um músculo, com receio de espantá-la, ao longo do que ele também associou a um escaneamento. Mesmo quando ela chegou na altura da revista e fez um muxoxo, claramente decepcionada. Ali foi um grande teste pois pensou em pegar a revista rapidamente. Mas venceu o desafio. Passado este momento ele notou que ela começava a esboçar um sorriso que ele achou lindo, doce e sedutor. Aliás ele estava se sentindo como se ela o despisse durante o percurso do olhar  aí a razão, o anseio, de pegar a revista pois pensou que ela poderia ficar instável. A revista.  Agradeceu a firmeza do jeans. Percebeu que ela o  avaliava sem um interesse em particular, pareceu-lhe mesmo um hobby, peculiar, mas um hobby. Só que quando seus olhos se encontraram estavam ambos sorrindo. Voaram  juntos lado a lado graças a um pequeno troca troca de poltronas que ele gentilmente argumentava como ser necessário para viajar junto à esposa, o que causava um leve estranhamento, provocador de batimentos cardíacos descompensados, em Laura. Depois dessa fizeram muitas viagens juntos e ela ensinou o jogo a Tiron e começaram a apostar quem conseguia fazer a melhor avaliação. As conclusões eram discutidas e as que podiam ser corroboradas eram contabilizadas como pontos. Quem perdia ficava à mercê do que o outro lhe impingiria, à título de castigo. A falta de habilidade ou ansiedade de ir dos pés aos peitos de alguma mulher, ou se deter por tempo considerado inadequado, por Laura, nas coxas da dita cuja desencadeava uma pena pesada. Tiron também considerava falta grave quando Laura se encantava com aquele espaço entre as coxas e o abdômen, sem revistas que o preservasse.  E quem perdia tinha que pagar a “prenda”,  às vezes durante o voo… Uia!!!!

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